Foto: RondôniaVip
Por Sandro Colferai, professor
Texto em referencia a matéria Polícia mata oito homens no interior de Rondônia
É segunda-feira, final da manhã, dia 13 de janeiro de 2014, século XXI.
Estou aqui sentado à minha mesa lendo sobre a cognição e, num dos
intervalos da leitura, abro alguns dos sites de notícia de Rondônia,
afinal é mais importante o que acontece perto da gente. As notícias
sobre a ação de um bando de criminosos em Campo Novo de Rondônia dominam
as manchetes. Primeiro fala-se da invasão de um quartel da PM, do roubo
de armamentos, de um policial baleado enquanto trabalhava, de reféns e
de saques na cidade. Tudo ao estilo do cangaço moderno! Depois aparecem
os relatos do deslocamento de forças especiais da PM para a região (em
aeronaves!), de um confronto na estrada, e de desencontrados números,
que dão conta de seis, sete, e até oito bandidos mortos.
Os relatos são curtos, urgentes, e cada
site quer antes dar a informação – afinal é fundamental sair na frente… E
os comentários abundam! Os internautas, ávidos por notícias frescas,
parabenizam os policiais pela eficiência. Todos parecem se sentir mais
seguros agora, pois há “menos oito” – como disse uma moça no seu
comentário. Entre os elogios aparecem alguns temerosos. O temor é pela
reação do pessoal dos “direitos dos manos” – esta uma expressão de outro
comentarista. Os mortos são bandidos, e por isso mereciam morrer. Os
mortos são gente que aterrorizou uma cidade inteira, baleou um policial,
e por isso mereciam morrer. Só esta reação nos comentários das matérias
merece uma detida reflexão sobre o estado das coisas, que nos trazem ao
ponto de se comemorar a morte de oito pessoas por forças do estado.
Mas, não é isso que quero fazer aqui. O
que quero é destacar o pronto reconhecimento feito pelo secretário de
segurança de Rondônia, Marcelo Bessa. O reconhecimento pelo bom
trabalho, que inclui a reação das polícias de Rondônia, a caçada e o
cerco aos bandidos, e uma camionete cheia de corpos mostrada em todos os
sites de notícias do Estado. Nos textos publicados ainda na manhã de
segunda-feira Bessa já os parabenizava. Aparentemente efusivo por tudo o
que acontecia, na sua página pessoal no Facebook o secretário publica,
por volta do meio-dia, a tal foto do amontoado de corpos na carroceria
da camionete e comenta: “Excelente trabalho! Parabéns guerreiros!”.
E aqui finalmente chego ao ponto! Os
policiais reagiram, perseguiram, cercaram, um tiroteio ocorreu e os
bandidos foram mortos em legítimo confronto para o qual todo policial
deve estar preparado. Mas, o homem que comanda as forças policiais de
Rondônia publicamente festejar um carreto de corpos, bom, aí já é
demais! O secretário parece querer esquecer que é o representante do
Estado que não oferece as condições necessárias para que invasões e
roubos a quartéis da PM não aconteçam. É o mesmo Estado que deixa a
população de uma cidade inteira à mercê de bandidos, que podem fazer
policiais reféns e saquear uma cidade inteira.
Não é hora de festejar! É hora de
prender os culpados e cobrar os responsáveis. Os primeiros são os caras
que atiraram contra policiais, roubaram armas e ameaçaram a gente de
Campo Novo. Os outros são os gestores do Estado, especialmente da
segurança pública, o mesmo setor que não raras vezes precisa lançar mão
de ajudas de empresários para fazer seu trabalho; cujos agentes, os
policiais, precisam ser criativos para dar conta das demandas sem a
devida estrutura; precisam se desdobrar para cobrir a necessidade de
segurança da sociedade frente ao reduzido efetivo; e a população, que vê
tudo isso, cobra um genérico investimento em segurança e desconfia que
as coisas não vão se resolver. Já parece não haver confiança na polícia e
registros de ocorrências mais servem como registro burocrático do que
esperança na resolução de seus casos!
Comemorar gente morta, qualquer gente,
não é a melhor reação, mas é sintoma. É sintoma de um estado que, ao que
tudo indica, prefere viver de espetáculo do que de planejamento,
preparação e prevenção. Precisamos aprender com os corpos amontoados e
com a população aterrorizada. Precisamos aprender com o policial baleado
e com os reféns. Precisamos prestar atenção às reações dos gestores,
afinal é 13 de janeiro de 2014, século XXI, época em que cangaceiros e
um monte de corpos não podem ser admitidos. Assim como a reação deve ser
uma crítica aos modos de tornar efetiva a segurança entre nós, e não
uma efusiva comemoração diante de pessoas mortas. Pensemos!
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