Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.

28 de agosto: 30 anos da Lei da Anistia


Rememore este marco da democracia e dos direitos humanos
No dia 28 de agosto de 2009, a Lei 6683/79 - Lei da Anistia Política -
completa 30 anos. Trata-se de uma das principais datas para a
cidadania brasileira, pois rememora uma conquista popular
fundamental da democracia e dos direitos humanos, num passo
importante na superação da ditadura militar.
Um marco simbólico dessa grandeza merece ser lembrado tanto para
valorizar conquistas do passado quanto para expressar o
compromisso com os valores envolvidos. É preciso educar as novas
gerações para a dimensão dos direitos conquistados, estimulando-as
a se engajar em movimentos capazes de realizar novos avanços
democráticos.
Por isso propomos a todas as Comissões de Direitos Humanos das
Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais que promovam seus
eventos com a finalidade de refletir sobre os 30 anos da Lei da Anistia.
A Câmara dos Deputados, por iniciativa desta Comissão de Direitos
Humanos e Minorias, realizará, no dia 31 de agosto, às 16h, uma
sessão solene de homenagem aos 30 anos de luta pela anistia, com a
presença de lideranças políticas e sociais.
Na oportunidade, sugerimos, também, que se busquem constituir
Comissões Estaduais de Anistia, visando promover o reconhecimento
por cada ente federado da condição de anistiado àqueles que,
mediante o devido processo administrativo e comprovados efetivos
prejuízos motivados por perseguição política, sejam indenizados na
forma da lei.
Também é importante que cada Estado crie sua Comissão de
Memória e Verdade para que a história da luta contra o regime de
exceção não seja esquecida, tampouco repetida.
Anistia: prova da capacidade de luta do povo brasileiro
A anistia resultou da luta de resistência de militantes e cidadãos
comuns indignados com a repressão, os assassinatos, a tortura, a
suspensão dos direitos como o de organização, a censura na
imprensa e tantas outras violações de direitos humanos que se
tornaram sistêmicas a partir do golpe militar/civil que depôs o
presidente eleito João Goulart, em 1o de abril de 1964. Também
contribuiu para a anistia a pressão feita do exterior, por governos
democráticos e setores da sociedade civil e do mundo da cultura.
Até hoje emocionam músicas como Apesar de você, de Chico
Buarque, e O bêbado e o equilibrista, de João Bosco e Aldir Blanc,
concebidas no calor da luta pela anistia e pelo fim da ditadura, cujo
momento culminante foi a campanha pelas Diretas Já, em 1984, que
embora não tenha atingido seu objetivo, forçou a substituição dos
governos militares pela eleição indireta da chapa Tancredo
Neves/José Sarney no Colégio Eleitoral.
Num primeiro momento, a anistia significou o retorno à pátria de
opositores políticos banidos e exilados, a libertação de presos políticos
e o arquivamento de processos arbitrários para outros, muitos sem
envolvimento direto em ações políticas.
Foi um passo importante no processo de redemocratização e deve ser
lembrado como uma conquista, que provou a capacidade de
mobilização e de luta pelos valores democráticos e solidários do povo
brasileiro.
Entretanto, o processo da Anistia segue em aberto, e há duas
questões importantes a exigir a reflexão nacional no marco dos 30
anos.

Atualidade da Anistia

A primeira é quanto à extensão da anistia àqueles que, em nome do
Estado, cometeram crimes contra a humanidade e contra os direitos
humanos, qualificados como crimes imprescritíveis em tratados
patrocinados pela ONU e OEA, dos quais o Brasil é signatário.
Respaldadas nesses instrumentos internacionais, juristas
independentes respaldam a interpretação de que os torturadores e
responsáveis por desaparecimentos forçados não podem se valer da
Lei da Anistia para escapar da justiça. Os crimes por eles cometidos
são crimes comuns contra a humanidade, e não crimes políticos, ao
contrário daqueles em que foram enquadrados os militantes políticos
atingidos pelos atos de exceção do regime militar.
Mesmo dentro do governo federal, há divergências de interpretação.
Enquanto o ministro da Defesa e o advogado-geral da União
entendem que os militares se beneficiam da lei de anistia, os ministros
da Justiça e da Secretaria Especial dos Direitos Humanos
compartilham a interpretação propugnada pelos tratados
internacionais sobre imprescritibilidade dos crimes de tortura e
desaparecimento.
Outra questão em andamento diz respeito à reparação aos que foram
perseguidos de várias formas pela repressão. Centenas de
requerimentos de anistia com pedidos de indenização estão sendo
analisados pela Comissão Especial de Anistia, no âmbito do Ministério
da Justiça. Nos últimos meses, os processos estão tramitando com
maior celeridade, em razão da mobilização dos anistiados e suas
famílias, com o apoio de entidades como a Comissão de Direitos
Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados e do próprio
presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Durante muitos anos, os processos demoraram longos períodos para
serem analisados. Houve casos individuais de indenizações
explorados à exaustão por segmentos políticos e da mídia
inconformada com o reconhecimento do direito dessas pessoas à
anistia, em geral militantes políticos e sindicais de esquerda e
servidores públicos.
Outra pendência importante decorrente da anistia aos perseguidos
pela ditadura de 1964 diz respeito ao resgate da verdade e da
memória. Muitos dos detentores de informações sobre o destino de
presos políticos desaparecidos, entre outras informações
fundamentais para a reconciliação da Nação com o seu passado
histórico, mantêm documentos ocultos, muitas vezes manipulando seu
conteúdo de acordo com a evolução da conjuntura, sempre no sentido
de preservar os interesses e a impunidade dos que participaram das
violações de direitos humanos na repressão.
A despeito desses crimes contra o direito à verdade e à memória,
fragmentos dos episódios têm vindo à tona por meio de depoimentos,
livros e pesquisas. Em maio último, foi lançado pelo governo federal o
projeto Memórias Reveladas, coordenado pela ministra Dilma
Rousseff e o ministro Paulo Vannuchi. O projeto sistematizou e
disponibilizou tudo o que foi possível recolher até agora em matéria de
documentos de valor histórico sobre o período.
Portanto, os 30 anos da Lei da Anistia representam uma oportunidade
para a reflexão e a mobilização da sociedade brasileira no sentido de
complementar o "acerto de contas com o passado". As tarefas estão
claras: resgatar os documentos e informações ainda escondidos;
reivindicar ao Judiciário a responsabilização dos que, em nome do
Estado, cometeram crimes imprescritíveis contra a humanidade; e
concluir o julgamento de todos os processos de reparação das vítimas
da repressão.
Não aceitamos que isso seja rebaixado pelos defensores da ditadura
como revanchismo. Isso é, sim, a conclusão de um processo, pois a
democracia não se faz com a omissão da justiça.
E, finalmente, este é um momento de valorizar a política como espaço
do exercício da democracia. Generalizar a crítica à política e a todos
os que de alguma forma participam da luta pelo bem comum, é abrir
caminho para o discurso golpista, o mesmo que condenou o Brasil aos
21 anos de ditadura.
Melhorar os procedimentos da política, fortalecer os mecanismos da
democracia participativa e da representação política qualificada,
aprovar no Congresso Nacional uma reforma política que reduza o
alcance dos vícios que minam a credibilidade do fazer político e suas
instituições, este é talvez seja o principal desafio a enfrentar para
consolidar a democracia no marco dos 30 anos da Lei da Anistia.

Brasília, 19 de agosto de 2009
Deputado Luiz Couto (PT-PB)
Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias
Todos os homens devem agir em relação aos outros com espirito de fraternidade

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