Crimes cometidos através da internet não são novidade. E recentemente o assunto esteve envolvido em uma nova discussão: fechar ou não o Orkut no Brasil. A iniciativa foi motivada, segundo o Ministério Público, pelo número crescente de crimes cometidos por usuários do site de relacionamentos. O MP alegou também que a empresa Google Inc., dona do Orkut, não tem colaborado nas investigações desses crimes. Mas, no início desta semana, a empresa se pronunciou e disse que não vai fechar o site no Brasil - o que deixou muitos dos internautas aliviados.
No último dia 31, a Justiça Federal de São Paulo determinou que a Google Brasil Internet Ltda. deve cumprir todas as ordens judiciais de quebra de sigilo temático de comunidades e perfis do Orkut, sob pena de multa.
No entanto, o assunto serviu também para trazer de volta a discussão acerca de legislação e direitos humanos na internet. Segundo estudos feitos pela Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos (SaferNet), uma organização não-governamental que combate crimes contra os direitos humanos na internet, 94,6% das denúncias são contra perfis e comunidades do Orkut. Das 86.188 denúncias recebidas, 81.549 foram contra o site de relacionamentos da Google. Dessas, 34.161 (42%) eram sobre pornografia infantil e pedofilia. A ONG estima que existam mais de 44 mil imagens de crianças de até 5 anos de idade e de adolescentes em cenas pornográficas e de sexo explícito no Orkut. Além disso, também foram encontradas comunidades sobre crimes raciais, venda de drogas, de receitas médicas em branco e de remédios sem receita no Orkut.
Um ponto que dificulta a investigação e a punição de crimes como esses são os obstáculos existentes na legislação brasileira. O debate sobre a atualização das leis já existe e ganha forças. Segundo o vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado Luiz Alberto (PT-BA), é lamentável que ainda não exista no País uma legislação específica para combater os crimes digitais. “Nossos debates são exatamente no sentido de apresentar uma proposta de legislação que dê ao Judiciário e ao Ministério Público instrumentos efetivos de combate a esse tipo de delito”, afirmou.
Reflexo da realidade
Mas quais os possíveis motivos do crescente uso da internet para cometer crimes contra os direitos humanos? Segundo o psicólogo e ex-professor de psicologia de uma universidade da região, Daniel Menezes Coelho, o que acontece no mundo virtual é um reflexo da realidade.
- Somos um dos poucos países onde existe a história de ‘lei que pega’ e ‘lei que não pega’. O sistema judiciário não funciona de acordo com o que está escrito no papel, com a letra da lei. Então, os espaços que ficam no meio da lei são largamente utilizados, sejam eles referentes à falhas ou à fiscalização. E isso acontece tanto no real quanto no virtual, ainda mais que não há leis específicas para a internet. Enquanto isso, o povo vai aproveitando essas brechas - explica Daniel.
De acordo com o psicólogo, certos tipos de site dão muito certo no Brasil pela própria formação do brasileiro. “O povo é muito receptivo e aberto a novas amizades. As pessoas se expõem muito”, aponta.
- Em relação a crimes de difamação, me parece que o fato de isso aparecer na internet reflete uma coisa que sempre funcionou dessa maneira. Em todo lugar em que há relações humanas fortes, estreitas, isso pode acontecer, por causa da rivalidade entre as pessoas. Dada a força do laço, podem crescer tanto o amor quanto o ódio - explica Daniel.
Geralmente, são pessoas conhecidas ou que sabem muito a respeito do outro que têm este tipo de atitude. “É como passar para o virtual algo que sempre aconteceu no mundo real. E isso, no Brasil, fica bastante em evidência pelo peso das relações humanas. A imagem do brasileiro lá fora é de um povo quente, animado, receptivo, carinhoso e que ama com intensidade. Por amar com intensidade, também pode odiar com intensidade”, diz.
- Teremos que esperar passar um tempo disso tudo para olharmos para trás e podermos ver como estão as coisas e analisar o que foi feito, o que funcionou e o que não funcionou. Tudo ainda é muito recente, e a internet está ganhando uma amplitude cada vez maior. Fica difícil acompanhar - ressalta Daniel.
Usuários apontam lados positivos e negativos
Não é preciso ir longe para encontrar casos em que o Orkut trouxe problemas para as pessoas. Perfis falsos, comunidades difamatórias, brincadeiras de mau gosto e outros estão espalhados pelo site de relacionamentos. E não é difícil conhecer ou saber de alguma história que tenha acontecido com alguém bem próximo. A estudante de Volta Redonda, Ana Catarina Duque, de 23 anos, tem exemplos bem próximos.
- Uma amiga minha teve uma comunidade criada contra ela, em que as pessoas a xingavam. Hoje ela está fora do Orkut. Os culpados foram identificados, responderam a um processo e pagaram multa. Um outro conhecido teve a página de seu perfil clonada. No perfil falso, ele era gay, e incluíram o endereço da residência, além de terem criado uma comunidade sobre ele. A Justiça conseguiu localizar o culpado, que também respondeu processo - conta Catarina.
Também de Volta Redonda, o estudante Jocimar Cerqueira Ramos, de 22 anos, conhece um caso em que o Orkut trouxe problemas. “Alguém criou uma comunidade sobre o filho de uma amiga minha, que tem apenas 12 anos, dizendo que tinha saído com ele, dando a entender que o menino era gay”, conta. “Foi bastante constrangedor, principalmente na escola. Hoje em dia, ele não tem mais um perfil no Orkut, e a comunidade já foi apagada”.
- Muita gente usa o site para difamar outras pessoas, ou até mesmo usar para fins mais graves, como pedofilia e tráfico. Vi comunidades do tipo ‘Amo a Suzane von Richthofen’ e ‘Eu entendo a Suzane von Richthofen’. É um desrespeito muito grande - enfatiza Jocimar.
Ambos acreditam que as pessoas devam ter cuidado ao colocar seus dados na rede. “Acho bom evitar colocar endereço e telefone, e também informações que possam levar a interpretações erradas a seu respeito. O Orkut é público, e as pessoas têm que ter consciência de que as informações estão lá para serem vistas”, dizem Catarina. Jocimar concorda.
- Eu adoro, mas tomo alguns cuidados. Coloco apenas as minhas próprias fotos, minha família não está no meu álbum. Endereço e telefone, nem pensar; só defini a cidade onde moro. Colocar dados demais na página pode trazer problemas. SEQÜESTRO - Recentemente, a mãe de uma amiga minha recebeu uma ligação dizendo que ela havia sido seqüestrada, e queriam R$ 10 mil de resgate. Claro que era mentira, e minha amiga estava bem, na casa do irmão. O telefone dela foi conseguido através do Orkut - alerta Jocimar.
POSITIVO - Reencontrar amigos de infância, amigos e parentes distantes são pontos positivos. Debater temas em comunidades específicas é outra forma de interagir no Orkut. “Eu apoio comunidades que estão dispostas a juntar pessoas pela luta contra teste ou sacrifícios feitos com animais, por exemplo. Gosto também de outras em que as pessoas expõem seus problemas e recebem conselhos de outras pessoas”, destaca Catarina. (ACJ)
Na região, o número de crimes cometidos através do Orkut ainda é pequeno. Segundo o Inspetor Edson Cândido, do Setor de Investigações da Polícia Civil, difamação, calúnia, e outros tipos de crime através do site são ocorrências raras. “Mas, quando acontecem, as investigações são feitas com a ajuda do setor de computação da Polícia Civil do Rio de Janeiro”, diz o inspetor.
Já na Polícia Federal, nada foi notificado desde o caso de Anderson Luiz Juliano Costa Borges, que foi preso por pedofilia. “Ele já foi julgado e condenado, e está preso no Rio de Janeiro. Ultimamente, relacionados à internet, temos registrado apenas crimes contra bancos, que se enquadram como estelionato”, conta o delegado Gustavo Stteel.
RELEMBRE O CASO - Anderson Luiz Juliano Costa Borges foi preso em junho, em sua casa, no bairro Jardim Belvedere. Com ele, foi encontrado o maior arquivo de material pedófilo do Brasil e um dos maiores do mundo. Entre fitas e fotos, ele apareceria, segundo a polícia, molestando sexualmente pelo menos 20 crianças. No total, ele teria cerca de 300 mil fotos. O caso teve repercussão internacional.
Orkut não assume responsabilidades
Quem acessa o Orkut já deve ter notado uma mensagem, ao entrar, que diz “Lembre-se: nós todos gostamos do orkut.com e contamos com a sua ajuda para mantê-lo saudável. Por favor, use o serviço com responsabilidade e não hesite em reportar imediatamente quaisquer abusos em perfis e comunidades. Conteúdo ilegal não será tolerado e será devidamente removido. Veja nossos Termos de Serviço”.
Dentre os termos do regulamento para o uso do Orkut, é especificado que os usuários devem ser maiores de 18 anos, e que não devem postar conteúdo ilegal.
As especificações dizem respeito à legislação de cada país, que deve ser obedecida, além de ressaltar que é proibido, por exemplo, utilizar informações de usuários para fins não autorizados, criar perfis falsos ou transmitir vírus ou outro item de natureza destrutiva.
Ao final dos termos, é enfatizado que o Orkut não se responsabiliza por danos associados à utilização do site. (ACJ)
No último dia 31, a Justiça Federal de São Paulo determinou que a Google Brasil Internet Ltda. deve cumprir todas as ordens judiciais de quebra de sigilo temático de comunidades e perfis do Orkut, sob pena de multa.
No entanto, o assunto serviu também para trazer de volta a discussão acerca de legislação e direitos humanos na internet. Segundo estudos feitos pela Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos (SaferNet), uma organização não-governamental que combate crimes contra os direitos humanos na internet, 94,6% das denúncias são contra perfis e comunidades do Orkut. Das 86.188 denúncias recebidas, 81.549 foram contra o site de relacionamentos da Google. Dessas, 34.161 (42%) eram sobre pornografia infantil e pedofilia. A ONG estima que existam mais de 44 mil imagens de crianças de até 5 anos de idade e de adolescentes em cenas pornográficas e de sexo explícito no Orkut. Além disso, também foram encontradas comunidades sobre crimes raciais, venda de drogas, de receitas médicas em branco e de remédios sem receita no Orkut.
Um ponto que dificulta a investigação e a punição de crimes como esses são os obstáculos existentes na legislação brasileira. O debate sobre a atualização das leis já existe e ganha forças. Segundo o vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado Luiz Alberto (PT-BA), é lamentável que ainda não exista no País uma legislação específica para combater os crimes digitais. “Nossos debates são exatamente no sentido de apresentar uma proposta de legislação que dê ao Judiciário e ao Ministério Público instrumentos efetivos de combate a esse tipo de delito”, afirmou.
Reflexo da realidade
Mas quais os possíveis motivos do crescente uso da internet para cometer crimes contra os direitos humanos? Segundo o psicólogo e ex-professor de psicologia de uma universidade da região, Daniel Menezes Coelho, o que acontece no mundo virtual é um reflexo da realidade.
- Somos um dos poucos países onde existe a história de ‘lei que pega’ e ‘lei que não pega’. O sistema judiciário não funciona de acordo com o que está escrito no papel, com a letra da lei. Então, os espaços que ficam no meio da lei são largamente utilizados, sejam eles referentes à falhas ou à fiscalização. E isso acontece tanto no real quanto no virtual, ainda mais que não há leis específicas para a internet. Enquanto isso, o povo vai aproveitando essas brechas - explica Daniel.
De acordo com o psicólogo, certos tipos de site dão muito certo no Brasil pela própria formação do brasileiro. “O povo é muito receptivo e aberto a novas amizades. As pessoas se expõem muito”, aponta.
- Em relação a crimes de difamação, me parece que o fato de isso aparecer na internet reflete uma coisa que sempre funcionou dessa maneira. Em todo lugar em que há relações humanas fortes, estreitas, isso pode acontecer, por causa da rivalidade entre as pessoas. Dada a força do laço, podem crescer tanto o amor quanto o ódio - explica Daniel.
Geralmente, são pessoas conhecidas ou que sabem muito a respeito do outro que têm este tipo de atitude. “É como passar para o virtual algo que sempre aconteceu no mundo real. E isso, no Brasil, fica bastante em evidência pelo peso das relações humanas. A imagem do brasileiro lá fora é de um povo quente, animado, receptivo, carinhoso e que ama com intensidade. Por amar com intensidade, também pode odiar com intensidade”, diz.
- Teremos que esperar passar um tempo disso tudo para olharmos para trás e podermos ver como estão as coisas e analisar o que foi feito, o que funcionou e o que não funcionou. Tudo ainda é muito recente, e a internet está ganhando uma amplitude cada vez maior. Fica difícil acompanhar - ressalta Daniel.
Usuários apontam lados positivos e negativos
Não é preciso ir longe para encontrar casos em que o Orkut trouxe problemas para as pessoas. Perfis falsos, comunidades difamatórias, brincadeiras de mau gosto e outros estão espalhados pelo site de relacionamentos. E não é difícil conhecer ou saber de alguma história que tenha acontecido com alguém bem próximo. A estudante de Volta Redonda, Ana Catarina Duque, de 23 anos, tem exemplos bem próximos.
- Uma amiga minha teve uma comunidade criada contra ela, em que as pessoas a xingavam. Hoje ela está fora do Orkut. Os culpados foram identificados, responderam a um processo e pagaram multa. Um outro conhecido teve a página de seu perfil clonada. No perfil falso, ele era gay, e incluíram o endereço da residência, além de terem criado uma comunidade sobre ele. A Justiça conseguiu localizar o culpado, que também respondeu processo - conta Catarina.
Também de Volta Redonda, o estudante Jocimar Cerqueira Ramos, de 22 anos, conhece um caso em que o Orkut trouxe problemas. “Alguém criou uma comunidade sobre o filho de uma amiga minha, que tem apenas 12 anos, dizendo que tinha saído com ele, dando a entender que o menino era gay”, conta. “Foi bastante constrangedor, principalmente na escola. Hoje em dia, ele não tem mais um perfil no Orkut, e a comunidade já foi apagada”.
- Muita gente usa o site para difamar outras pessoas, ou até mesmo usar para fins mais graves, como pedofilia e tráfico. Vi comunidades do tipo ‘Amo a Suzane von Richthofen’ e ‘Eu entendo a Suzane von Richthofen’. É um desrespeito muito grande - enfatiza Jocimar.
Ambos acreditam que as pessoas devam ter cuidado ao colocar seus dados na rede. “Acho bom evitar colocar endereço e telefone, e também informações que possam levar a interpretações erradas a seu respeito. O Orkut é público, e as pessoas têm que ter consciência de que as informações estão lá para serem vistas”, dizem Catarina. Jocimar concorda.
- Eu adoro, mas tomo alguns cuidados. Coloco apenas as minhas próprias fotos, minha família não está no meu álbum. Endereço e telefone, nem pensar; só defini a cidade onde moro. Colocar dados demais na página pode trazer problemas. SEQÜESTRO - Recentemente, a mãe de uma amiga minha recebeu uma ligação dizendo que ela havia sido seqüestrada, e queriam R$ 10 mil de resgate. Claro que era mentira, e minha amiga estava bem, na casa do irmão. O telefone dela foi conseguido através do Orkut - alerta Jocimar.
POSITIVO - Reencontrar amigos de infância, amigos e parentes distantes são pontos positivos. Debater temas em comunidades específicas é outra forma de interagir no Orkut. “Eu apoio comunidades que estão dispostas a juntar pessoas pela luta contra teste ou sacrifícios feitos com animais, por exemplo. Gosto também de outras em que as pessoas expõem seus problemas e recebem conselhos de outras pessoas”, destaca Catarina. (ACJ)
Na região, o número de crimes cometidos através do Orkut ainda é pequeno. Segundo o Inspetor Edson Cândido, do Setor de Investigações da Polícia Civil, difamação, calúnia, e outros tipos de crime através do site são ocorrências raras. “Mas, quando acontecem, as investigações são feitas com a ajuda do setor de computação da Polícia Civil do Rio de Janeiro”, diz o inspetor.
Já na Polícia Federal, nada foi notificado desde o caso de Anderson Luiz Juliano Costa Borges, que foi preso por pedofilia. “Ele já foi julgado e condenado, e está preso no Rio de Janeiro. Ultimamente, relacionados à internet, temos registrado apenas crimes contra bancos, que se enquadram como estelionato”, conta o delegado Gustavo Stteel.
RELEMBRE O CASO - Anderson Luiz Juliano Costa Borges foi preso em junho, em sua casa, no bairro Jardim Belvedere. Com ele, foi encontrado o maior arquivo de material pedófilo do Brasil e um dos maiores do mundo. Entre fitas e fotos, ele apareceria, segundo a polícia, molestando sexualmente pelo menos 20 crianças. No total, ele teria cerca de 300 mil fotos. O caso teve repercussão internacional.
Orkut não assume responsabilidades
Quem acessa o Orkut já deve ter notado uma mensagem, ao entrar, que diz “Lembre-se: nós todos gostamos do orkut.com e contamos com a sua ajuda para mantê-lo saudável. Por favor, use o serviço com responsabilidade e não hesite em reportar imediatamente quaisquer abusos em perfis e comunidades. Conteúdo ilegal não será tolerado e será devidamente removido. Veja nossos Termos de Serviço”.
Dentre os termos do regulamento para o uso do Orkut, é especificado que os usuários devem ser maiores de 18 anos, e que não devem postar conteúdo ilegal.
As especificações dizem respeito à legislação de cada país, que deve ser obedecida, além de ressaltar que é proibido, por exemplo, utilizar informações de usuários para fins não autorizados, criar perfis falsos ou transmitir vírus ou outro item de natureza destrutiva.
Ao final dos termos, é enfatizado que o Orkut não se responsabiliza por danos associados à utilização do site. (ACJ)
1 comments:
Olá! Sou Giovanna Carvalho da Edelman, agência de comunicação da Symantec, tudo bem?
Vi o seu post e gostaria de complementar que um crime bastante discutido nos EUA é o cyberbullying, ou o ato de ameaçar e constranger alguém por meio da tecnologia.
Existem casos de adolescentes vítimas de cyberbullying que chegaram a cometer suicídio. É preciso que tenhamos leis digitais mais claras de forma que consigamos coibir o acontecimento de crimes desse tipo no Brasil.
Um abraço, Giovanna.
[email protected]
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